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Ecologia, filosofia e educação: diálogos transdiciplinares na perspectiva da sustentabilidade.

 

Como a filosofia pode ajudar a educação a compreender os temas ambientais?

É possível uma conexão verdadeira entre as Ciências Naturais e as Ciências Humanas, e como este diálogo poderia auxiliar para uma visão holística do mundo e do Ser Humano inserido nele?

A Ciência afirma ser capaz de explicar a realidade, mesmo que não haja uma única resposta, os cientistas de nossa história sedentos por dados objetivos criam metodologias para fundamentar e produzir os mais diversos conhecimentos que salvarão os seres pensantes de uma possível revolta e dominação das outras espécies, mas a visão antropocêntrica está incorporada nos pensamentos, sentimentos e comportamentos humanos desde as suas primeiras reflexões em sociedade, o que torna difícil fazer com que o ser humano perceba sua real e pequena participação planetária.

Os homens e as mulheres, chamados de seres pensantes precisam perceber que não são nem donos nem protetores do planeta, porque o fenômeno da vida, como diz Loveloock, está em escala planetária e a evolução diz respeito à Gaia.

Já sabemos da impossibilidade de ocorrer uma verdade absoluta, ou seja, a guerra de ideologias é insana, no entanto há um planeta absoluto que recebe drásticamente a influência das produções humanas que remetem às alterações climáticas, que por sua vez tornarão impróprio a habitação da espécie humana na biosfera terrestre.

Se somos inquilinos inconseqüentes precisamos de um senhorio que nos mostre regras justas, e esse senhorio já bate a nossa porta a algum tempo, mas nosso medo de mudar os “prazerosos e costumeiros hábitos” nos impede de abrir a mente para refletir que existe algo a mais do que nosso egocêntrico jeito de ser. 

Praticamente todos os dias vemos nos noticiários as catástrofes ambientais, os números absurdos, infelizmente, não cogitam mudanças políticas, econômicas e sociais e assim assistimos a bola de neve da impassividade ser repassada às gerações.

Até quando seremos criados e educados para transformar o mundo e toda a sua rica variedade de detalhes em “saber habitual”, padronizado e enlatado à venda nas prateleiras dos supermercados? 

Precisamos perceber que somos seres que compartilhamos um só destino. Precisamos pensar que há outras faces a serem desvendadas, e que o “ponto de vista do planeta Terra” é mais importante que nossa insignificante filosofia humana. Somos uma coletividade de seres, e assim devemos pensar que para termos liberdade devemos lembrar de “preservar”, para a nossa sobrevivência, o planeta, que não está diante nem da primeira e nem da ultima espécie que usufrui seu ambiente.

Assim, condicionados e presos ao estilo cientificista de sobreviver, devemos adequar as descobertas para explicitar o que está implícito por detrás dos interesses humanistas vindouros à contemporaneidade. Será que as antigas questões perderam as forças? Quem somos, de onde viemos e para onde vamos não fazem mais parte da curiosidade humana e a preocupação contemporânea é produzir e consumir o mundo material?

Pelizzoli levanta o debate da ética e pergunta onde está a sensibilidade que nos tornava unidos com o cosmos. A revolução científica sufocou nossa poesia e precisamos resgatá-la para nos compreender melhor.

A filosofia como instrumento primordial dos questionamentos humanos poderia ser o caminho para a não normatização dos sujeitos, e sim para uma real emersão da reflexão praticada em ações diárias e independentes do locus social. Ao passar pelas reflexões da Hermenêutica, que postula explicar e compreender o impensado usando como meios a linguagem, podemos vislumbrar um caminho para trabalhar a educação ambiental com os discentes. Para a hermenêutica aquilo que pensamos manifesta-se em palavras que gerarão ações. Assim, para modificarmos nossas ações devemos modificar nossos pensamentos que por sua vez serão despertados pelas palavras.

A hermenêutica diz que o homem constrói sua história pelos símbolos e mitos criados, que ocasionam significações de uma linguagem filosófica. Nos dicionários encontramos a hermenêutica como a interpretação do sentido das palavras, das leis, dos textos, mas a hermenêutica possui um discurso transdisciplinar que também é o discurso ambiental, ambas podem proporcionar ao aluno uma pedagogia que dialogue mais com os sentidos do que com a lógica. Marcos Ferreira dos Santos ao questionar a relação pedagógica na hermenêutica encontra um campo vasto de possibilidades que podem promover uma mudança comportamental visando trabalhar com a diferença que pode ser a base do funcionamento da unidade, quebrando ou atenuando, desta forma, com o paradigma egocêntrico e a cientificidade como o único caminho.

A palavra dita é expressão não apenas verbal como também comportamental. A palavra possui um poder que pode construir ou destruir uma sociedade. A justiça muitas vezes torna-se injusta devido às incorporações, às vezes inconscientes, de palavras. Tornar-se necessário quebrar o ciclo da linguagem opressora e antropocêntrica e a educação ambiental aproxima o discente da informação sensível e real que está por trás dos diferentes tipos de manipulação social.

Segundo Jacobi para ocorrer uma mudança paradigmática, a clareza dos acontecimentos e o estudo contínuo da incerteza de um futuro seguro para os seres humanos, devem estar em primeiro plano.

Desta forma acredito não existir metodologias, receitas ou cartilhas que levarão os educadores a alcançar resultados fundamentalmente ético-socioambientais, já que sua influência é pequena diante da complexidade do educar, que tem um sentido de diversidade, coletividade, e não pode ser encaixado numa identidade igualitária global, tornar-se então necessários reajustes às linguagens, às interpretações dos mitos e dos símbolos para despertar uma reflexão do que significa estar vivenciando a experiência humana.

Apenas aqueles que refletem podem ser atemporais e ao mesmo tempo ambientais, no sentido mais complexo desta palavra e a educação ambiental e a filosofia como instrumento despertador das visões cristalizadas torna-se essencial para compreendermos a realidade em que estamos inseridos.

Pensar em níveis de realidade diferentes traz a possibilidade de agirmos no mundo também de forma distinta e este é o objetivo de uma educação transdisciplina.

Para o paradigma cientificista os opostos são excludentes, ou somos contínuos, ou somos descontínuos, ou somos únicos, ou somos diversos, ou somos previsíveis, ou somos imprevisíveis e, portanto estamos limitados a sermos apenas uma coisa

A idéia é sair de uma visão unilateral para uma visão multilateral, mas sem o fanatismo de achar que a transdiciplinaridade seja o único caminho e a única verdade, pelo contrario, esta proposta sugere a existência mútua de forma rigorosa e coerente de “mais de uma verdade”, pois as combinações de realidades e de percepções da mesma são infinitas.

O conhecimento então evolui em movimento espiral, abrangendo o que já fora estudado e estando aberto para novos caminhos sem nenhuma resistência.  O mundo é relativo, não há normatizações e regras fechadas, os acontecimentos dependem das circunstâncias que nem sempre são as esperadas, e por isso devemos desenvolver a capacidade de compreender diferentes níveis de realidade não fechando nossa percepção em um único olhar. Somos sujeitos e objetos com conhecimentos que são ao mesmo tempo externos e internos e temos a capacidade de acessar essa compreensão.

Nicolescu fala que somos sujeitos trasndisciplinares por natureza e que a transdisciplinaridade é a transgressão da dualidade: sujeito/ objeto, matéria/ consciência, simplicidade/ complexidade, reducionismo/ holismo, diversidade/ unidade, natureza/ divino.

A visão dual tão impregnada em nossa historia atrasou consideravelmente uma evolução social mais equilibrada. Há um fato triste em nossa realidade, o homem é mortífero com seus diferentes, com seus iguais e até mesmo com suas ideologias. A natureza que comporta uma biosfera diversificada e rica começou a sofrer terríveis mutações deste o momento em que um certo animal se tornou “racional”, ela tem se modificado bruscamente, no entanto a força da natureza continua a mesma desde os inicio dos tempos. Nossa espécie que também sofreu alterações desde o inicio é que enxerga a natureza de formas diferentes, em tempos diferentes da sua historia conforme seus valores vigentes. Nosso imaginário constrói realidades distintas pela direta influência do meio em que vivemos, ou seja, o grau de desenvolvimento da ciência e das técnicas, da organização social, da arte, da religião entre outros fatores conjuntamente nos influência para inventamos diferentes naturezas (percepções de realidades).

Somente um acordo entre um sujeito e um objeto que transcendam, que considerem os diferentes níveis de percepção e diferentes níveis de realidade é que trarão a quebra do paradigma que tanto nos maltrata. 

A ciência e o homem caminhando juntos para a abertura de conhecimentos que abranjam também o amor e a tolerância, onde o individuo mantenha suas necessidades pessoais e o coletivo possa compartilhar um bem comum. Porque separar as Ciências Naturais das Ciências Humanas, se ambas lidam com a vida? Querer obter com exatidão esta resposta talvez seja ignorar, com ingenuidade, a força do tempo, a dicotomia é um fato, e está tanto no passado como no presente, no entanto estas questões trouxeram algumas sugestões para refletir; Talvez separamos o mundo em certo e errado, em dia e noite, em claro e escuro, em frio e quente, em ciências naturais e humanas para tentarmos compreender melhor cada face do fenômeno. Entender o fenômeno significa controlá-lo, controlar sua natureza e, portanto tudo o que há ao seu redor.

Este pensamento trouxe à espécie humana uma certa idéia (ilusória) de superioridade. Mas este juízo é tão forte que cegou o ser humano e ele não consegue mais perceber sua pequenez diante dos fenômenos e do planeta. A conseqüência desta ação é uma concepção de superioridade não só para com seus diferentes, mas para com seus iguais, o que leva a uma guerra insana de egos e um estado profundo de individualismo.

Estar submerso em uma contínua concepção de dualidade faz pensarmos não existir mais nenhuma forma de mundo, como a ilusão de “Matrix”, e quebrar com esta cristalização talvez não seja fácil, talvez necessite muito mais que escolhas. A transdiciplinaridade tem um caráter de enxergar o mundo através de uma visão complexa que está presente em todos o campos da vida e em todas as ciências, sejam elas exatas, biológicas ou humanas. Assim não podemos limitar o conhecimento de uma área, porque as especializações se aprofundam num objeto de estudos e acaba esquecendo todas os possíveis diálogos entre outros campos de conhecimento. Mas esta comunicação é essencial para compreendermos todo o sistema.

A conseqüência de pensarmos em uma interdependência de saberes, de conhecimentos e realidades faz pensarmos em uma somatória de visões que nos permite compreender o todo e não somente as partes que nos dá uma visão limitada da realidade. Pois, além do dia e da noite há a aurora e o entardecer, além do quente e frio há o morno, além das ciências naturais e as ciências humanas há o planeta Terra.

Portanto há mais coisas além daquilo que acreditamos e desta forma podemos dizer que é possível sim a quebra do paradigma antropocêntrico, através da formação de uma concepção de comunhão ou de diálogo entre diferentes epistemologias. Neste trabalho foi sugerido pensarmos pelas perspectivas da filosofia, da ecologia e da educação. Trazer uma teoria cientifica, como por exemplo a Teoria de Gaia aos discentes aparelha-os a compreender o papel do ser humano no planeta,  trabalhar com a física quântica é outro meio para compreendermos que existem outras realidades, utilizar-se da hermenêutica é discutir todo o discurso apresentado refletindo se ali há alguma verdade e se é a única verdade que podemos achar diante de uma compreensão de mundo. Pensar tudo isso pelo processo transdiciplinar que permite sairmos do mundo fragmentado para um mundo holístico, onde o sujeito e o objeto são inseparáveis.

A vida como conhecemos ocorre numa escala tão ínfima que podemos dizer que somos um milagre, desta forma devemos lutar para continuar na condição de seres milagrosos, para isso somente uma visão infinita do todo nos fará compreender nossas forças, nossas capacidades, nossas inteligências. Elas não são limitadas, portanto não podemos aceitar uma visão de mundo limitada como a que vivemos à alguns séculos. Falar de ecologia, de filosofia e educação significa falar de seres humanos, portanto podemos dizer que um pensamento hermenêutico é um pensamento transdiciplinar pois está além daquilo que temos e além daquilo que conhecemos o que o torna também é algo milagroso.

Se sabemos que existe no Universo inteiro a mesma substância que há no corpo de um bebê, ou num livro acadêmico então qual a dificuldade de compreendermos que somos tudo uma coisa só? E porque insistimos em ficar apenas com nosso lado racional? Porque não damos valor àquilo que somos de fato? Seres complexos, que amam e que gostam de serem amados. Seres que sabem que um por do sol é muito mais que raios ultravioletas advindo de uma estrela morta. Antes víamos o mundo com um olhar temeroso, não entendíamos os fenômenos que nos cercavam e isto de certa forma nos colocava em posição de submissão ao planeta, depois fomos conseguindo não só entender e classificar os fenômenos como também controlá-los, o que nos fez alimentar uma ilusão estúpida de superioridade ao planeta. Perdemos desta forma o respeito por tudo, pela natureza e por nós mesmos. Temos que modificar o paradigma em que nos encontramos, temos que quebrar com a idéia de que o planeta é um produto para ser consumido, não devemos voltar a ter medo,devemos resgatar o respeito.

Enfim, é preciso quebrar com nosso egocentrismo, é preciso quebrar com o sistema curricular que nos tornou tão fragmentados como um copo em pedaços espalhados no chão de mármore. A educação pode sim ser ajudada pela filosofia para compreender os temas ambientais. Um dialogo transdiciplinar na perspectiva da sustentabilidade de toda raça humana e a todo o planeta.

Lesly Monrat - 2008

 

Trabalho de Iniciação Científica apresentado a banca de projetos da FEUSP em 2008.

Para ler o artigo inteiro em pdf

 

 

 

 

 

Fenomenologia da percepção em Maurice Merleau-Ponty no diálogo com o pensamento ecológico.

 

Como eu percebo o mundo?

Se pudermos entender como percebemos o mundo talvez possamos mudar nossa forma de viver o mundo?
Eu percebo pelos sentidos, pelas emoções, pelo meu corpo, pela minha consciência, pela minha energia ou será por outro meio?
O jeito que percebo o mundo é de uma forma real ou abstrata? A realidade que percebo é mesmo a “realidade verdadeira” ou eu estou imaginando e criando uma realidade?
Se eu crio uma realidade eu posso perceber que estou fazendo isso? E posso modificar essa situação?
Quem diz o que é real?
O real é pessoal, é coletivo é oportuno?
Eu vivo uma realidade criada por meus antepassados? Se a realidade é construída, eu consigo perceber que “nasci fora desta criação” e que fui moldada para acreditar nesta construção?
Eu consigo me tornar consciente de todo o processo? A consciência existe antes da percepção ou ela só pode existir depois de perceber a realidade?
O que eu percebo é verdadeiro?
Como funciona o fenômeno perceber?
Para tentar compreender essa máxima, o estudo da obra de Maurice Merleau-Ponty “Fenomenologia da percepção” (2006) torna-se importante para entender esta questão filosófica e para nos levar a compreender o fenômeno da vida, do mundo e do ser inserido no planeta.
Outro ponto fundamental deste trabalho trata-se da temática pertencente à educação ambiental. Quando tratamos do ser tratamos do ambiente já que estamos envolvidos nele e quando percebemos a nossa dinâmica no ambiente podemos desenvolver uma ação e, conseqüentemente, uma educação critica e consciente dos problemas ambientais e sociais.
Uma lenda hindu utilizada para educar as crianças conta a história de três sábios cegos, que ao tocarem uma parte especifica de um elefante afirmavam ser três animais distintos, o que resultou em briga verbal e física. Cada um dizia ser dono da verdade e de fato eram, mas apenas de uma parte.
A visão que o individuo possui de mundo faz-se refletir em suas ações, assim nos fala Platão em sua parábola da caverna. Agimos conforme nossas crenças, fundamentadas numa percepção parcial da realidade baseada em nossa experiência.

Lesly Monrat -  2008

 

Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado à banca da FEUSP em 2008.

Para ler o trabalho completo abaixe o arquivo em pdf

 

 

 

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